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quarta-feira, 19 de agosto de 2015

Cariri: Ato com palestra sobre Assédio Moral em abordagem sobre o sistema capitalista

O Comando Local de Greve dos Técnico Administrativos em Educação (TAE), Cariri, com a diretoria do SINTUFCE e o advogado Clovis Renato Costa Farias realizam ato instrutivo para alertar sobre o assédio moral nas relações de trabalho, com suas causas e consequências no perecimento da dignidade da pessoa humana.
Após as saudações pelo servidor Gideão, a Coordenadora Geral do SINTUFCE Telma Araújo parabenizou os servidores pela união e solidariedade que está ocorrendo na greve dos TAE no Cariri, destacando as pautas e o nível da negociação em Brasília.
Clovis Renato, advogado da entidade sindical, fez diversos esclarecimentos sobre o problema da centralidade do trabalho no sistema capitalista, que leva a ocorrência de assédios morais tanto de forma vertical (“chefe” e “subordinado”) e horizontal (entre trabalhadores de mesmo nível hierárquico nas relações de trabalho).
Ressaltou que o ambiente assediante malfere, dentre outras esferas, a saúde do trabalhador, destacando-se que, conforme a Organização Mundial de Saúde (OMS), a saúde é um estado de completo bem-estar físico, mental e social e não somente ausência de afecções e enfermidades.
Já o assédio moral ocorre com atos cruéis e desumanos que caracterizam uma atitude violenta e sem ética nas relações de trabalho, praticada por um ou mais chefes contra seus subordinados (vertical) ou entre os pares de hierarquia equivalente. Há exposição a situações vexatórias, constrangedoras e humilhantes no ambiente de trabalho, os quais visam humilhar, desqualificar e desestabilizar emocionalmente a relação da vítima com a organização e o ambiente de trabalho, o que põe em risco a saúde, a própria vida da vítima e seu emprego.
A ocorrência fortalece a discriminação no trabalho, a manutenção da degradação das relações de trabalho e a exclusão social; demarca um risco, por vezes, “invisível”, mas concreto, nas relações de trabalho e que compromete, sobretudo, a saúde das trabalhadoras; ocasiona desordens emocionais, atinge a dignidade e identidade da pessoa humana, altera valores, causa danos psíquicos (mentais), interfere negativamente na saúde, na qualidade de vida e pode até levar à morte.

Definidos os eixos a serem apresentados, a exposição do advogado tomou como norte as teorias de Karl Marx na obra Os Grundrisse, bem como nas obras “Tempo, trabalho e dominação social” (Moishe Postone), “Manifesto contra o Trabalho” (Grupo Krisis), “Dinheiro sem valor” (Robert Kurz), as quais foram sendo apresentadas com arremates jurídicos legais e jurisprudenciais.
Do “Manifesto contra o Trabalho”, elaborado pelo Grupo Krisis, relembrou que o ambiente assediante decorre, especialmente, pela percepção de que o tempo das pessoas deixa de ser tempo vivido e vivenciado e torna-se simples matéria-prima que tem de ser otimizada, sendo as pessoas alienadas de sua condição humana e tratadas como coisas (processo de reificação), o que se torna solo propício para a ocorrência das várias formas de assédio, como destacado da obra:
“[...] Nesta esfera, separada da vida, o tempo deixa de ser tempo vivido e vivenciado, torna-se simples matéria-prima que tem de ser optimizada: «tempo é dinheiro». Cada segundo é contabilizado, cada ida à casa-de-banho é um escândalo, cada conversa é um crime contra a finalidade autonomizada da produção. No local de trabalho, apenas pode ser gasta energia abstracta. A vida fica lá fora - ou porventura em parte nenhuma, porque a cadência do trabalho rege interiormente todas as coisas. Até as crianças são domesticadas pelo relógio, para que um dia possam ser «eficientes». As férias só servem para a recuperação da «força de trabalho». E mesmo às refeições, nas festas e no amor, o ponteiro dos segundos faz tiquetaque na nossa cabeça.” (In: Manifesto contra o Trabalho. Net: http://vidaarteedireitonoticias.blogspot.com.br/2014/01/reflexao-manifesto-contra-o-trabalho.html).
Na mesma linha de raciocínios, Clovis Renato seguiu destacando resíduos da obra de Moiche Postone, com base na obra marxiana “Os Grundrisse”:
“Uma característica do capitalismo é que suas relações sociais essenciais são sociais de uma maneira peculiar. Elas existem não como relações interpessoais abertas, mas como um conjunto quase independente de estruturas que se opõem aos indivíduos, uma esfera de necessidade impessoal ‘coisal’ e ‘dependência coisal’. Consequentemente, a forma de dominação social característica do capitalismo não é abertamente social e pessoal: ‘Essas relações de dependência coisal [...] aparecem de maneira tal que os indivíduos são agora dominados por abstrações, ao passo que antes dependiam uns dos outros’. O capitalismo é um sistema de dominação abstrata e impessoal. Em relação à formas sociais anteriores, as pessoas parecem independentes; mas, na verdade, são sujeitas a um sistema de dominação social que não parece social, e sim ‘objetivo’.
A forma de dominação peculiar ao capitalismo é também descrita por Marx como a dominação de pessoas pela produção: Os indivíduos estão subsumidos à produção social que existe fora deles como uma fatalidade. Mas a produção social não está subsumida aos indivíduos que a utilizam como seu poder comum’. Esse trecho é de importância fundamental. Dizer que os indivíduos são incluídos sob a produção é dizer que são dominados pelo trabalho social. Isso sugere que a dominação social no capitalismo não pode ser suficientemente entendida como dominação e controle dos muitos e de seu objeto de trabalho por poucos. No capitalismo, o trabalho social não é somente o objeto de dominação e exploração, mas é, ele próprio, o terreno de dominação. A forma não pessoal, abstrata, ‘objetiva’ de dominação característica do capitalismo está aparentemente relacionada à dominação dos indivíduos por seu trabalho social.” (In: POSTONE, Moiche. Tempo, trabalho e dominação social: uma reinterpretação da teoria crítica de Marx. Trad. Amilton Reis, Paulo César Castanheira. 1. ed. São Paulo: Boitempo, 2014. p. 149-150)
Em tal contexto, Clovis Renato destacou que as pessoas estão vivendo dominadas por categorias abstratas intrincadas (trabalho-dinheiro-consumo), de modo que, ao invés de se compreenderem como dignas naturalmente, estão fetichizadas para achar que somente podem “ser” por meio de estruturas como o trabalho e o dinheiro/consumo, o que as coloca em posição de exposição ao assédio moral e, não raro, como assediadoras. Como destacado por Robert Curz:
“[...] Do facto, evidente, de as pessoas terem sempre de produzir os seus géneros alimentícios não decorre automaticamente que esse estado de coisas seja, para elas, decisivo, e contenha em si uma lógica própria, definidora da sua sociedade e determinante de todos os outros momentos da via. É um mito moderno supor que a produção, ou, na acepção moderna, o ‘trabalho’, tenha preenchido a vida no seu todo nos primórdios da Humanidade, que a sua carga tenha sido depois ligeiramente reduzida, à custa de muito esforço, com o ‘desenvolvimento das forças produtivas’, e que só a gloriosa Modernidade do capital, com recurso à técnica e à ciência, tenha produzido o potencial de ‘tempo livre’ em grande escala. Marx apenas acompanha parte deste mito – no que respeita à fadiga extrema que os tempos pré-modernos teriam representado; ao mesmo tempo, sabe e afirma que só o fetiche do capital transforma a totalidade do tempo de vida do ser humano em ‘tempo de trabalho’ num patamar cada vez mais elevado.” (In: KURZ, Robert. Dinheiro sem valor: linhas gerais para uma transformação crítica da economia política. Trad. Lumir Nahodil. Lisboa: Antígona, 2014. p. 79)

Tal contexto sócio-jurídico, em linhas gerais, envolve o sistema capitalista com sua estruturas e  contradições, especialmente, no âmbito do trabalho, sendo relevantes as reflexões aptas a provocarem questionamentos à realidade para a busca de saídas aptas a garantirem a dignidade e a emancipação humanas.
Os servidores lotados na Universidade Federal do Cariri (UFCA), em greve por melhorias nas condições de trabalho, realizaram o encontro por estarem sentido diversas condutas assediante durante a paralisação, de modo que foram sugeridas ações no correr da paralisação a serem desenvolvidas, em parceria com o sindicato, pelo CLG.
Clovis Renato Costa Farias
Doutorando em Direito pela UFC/Bolsista CAPES
Advogado Vice Presidente da Comissão de Direito Sindical da OAB

Membro do GRUPE

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